domingo, 29 de junho de 2008

Rossa Nova *

I - Sou luta
Pelo espaço do chão
Invasão
De passos suspensos
Sob areia movediça
Sou por justiça:
Homem da guerra da terra.


II - Sou violência
Da cidade
Simplicidade
Em meio à vaidade
Das gentes
Sou sobrevivente:
Homem da terra da guerra.


III- Sou balançado
Do vento aflito
Conflito
do sentir
Irrestrito
Sou sem palmas:
Homem da guerra da alma.


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Canto do Canavial


Canto do canavial
Feito dos acordes
do acordar matinal
Em dias de sol a pino.
Canto de menino que ressoa:
Farfalhar de folhas.
Batuque da terra batida.
Solo do solo só.
Canto sem dó.
Que falta-lhe
na escala
As notas de fim e começo
Canto em tropeços
Ao som dos metais
das facas
do corte
da mata.


* Textos escritos a partir das músicas "Visão" (I) e "O Canto do Canavial" (II), da banda Rossa Nova (que, por sinal, produz um ritmo super interessante e são muitos simpáticos!). Para quem quiser conferir: http://www.rossanova.com.br/ .

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Mulher rendada

Alfinetam-me a alma
Essas dores pequenas
Das costuras derradeiras
Dos costumes a moldar.
Não fosse o alinhavo
Das agulhas rendeiras
Seria eu
(livre das penas)
Um pedaço de seda
Flutuando no ar!

domingo, 22 de junho de 2008

Passagem

Os pássaros

(depois que engoliram o ar!)

deixaram de passear aos passos

e passaram a voar!

quinta-feira, 19 de junho de 2008

Sarando

Dizia o poeta sobre o frio
na voz suave de uma dama.
E o sopro doce que do vento emana,
de menina-boneca, cantarilhado vinha.
Encontra-me sozinha
a fazer uma prece
por ares mais quentes...
É que em meio a tanta gente!,
Minha alma inibida se encolhe
E sente, de fato, tanto frio!
Faz-se alma vagueando pelo vazio:
Pulmão, coração, abdômen.
Todo o caminho da fome.
Chega às pernas, canelas.
Esconde-se do rosto.
E somente quando é posto
novo acorde
na viola,
Ela enfim, por um pouco, desenrola
e se atreve a batucar por entre os dedos.
Mas cedo cessa
sua pequena aventura!
Alma retoma sua defesa e compostura
Vai à coluna, entortá-la um pouco mais!
E ora cruza-se nos braços,
Ora põe as mãos em laço
Horas no espaço, protegendo,
É só o que faz!

Mas é então que a luz de tudo se apaga...
E um brilho, de repente, pela sala:
um candeeiro, sorrateiro, que a chama!


E inflamado um calor que alumia,
Essa tal alma até entanto arredia,
Se inebria pelo vermelho destemor!
Que o fogo logo impõe-se
(com louvor!),
E não contente em ter na luz a sua graça
O mesmo brio, tão confiante, se transpassa,
Espalha em fumaça se exibindo em seu ardor!
Assim em pouco a velha alma, hesitante,
Vai-se envolvida pelo tal tremor dançante!,
E esquecendo, pelo instante, seu disfarce,
Deixa entrever por um momento sua face,
Por fim desfaz-se
na coragem
de um sorriso.

terça-feira, 17 de junho de 2008

Questão de gênero

O mar-é.
Conforme o caminho da lua.
Nova.
Crescente.
Toda sua!
E minguante.
A maré vazante
e o mar.
Gênero variante
de amar.

sábado, 14 de junho de 2008

VLADO *

Eletrochoque
Na testa
Na fresta
Do ouvido
E o grito
Da entranha
Emaranhado
Da dor
Presa
Na teia
Do DOP
Do DOI
Dá dó
Dá dado
Dá número
Errado
Azar
Azedo
Exílio
Pra fora
do trilho
Na rua
Procura
Por si:
Tortura.

* À Vladimir Herzog, cineasta e jornalista brasileiro torturado e morto durante a ditadura militar. À todos os demais que, de alguma forma, tiveram a alma comprimida pela brutalidade do período. E àqueles que, ainda hoje, também sofrem com a tortura velada dos eletrochoques das barbáries da vida cotidiana.

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Dia dos abraçados

Eu? Preciso dos braços.
Eu preciso de braços e abraços
Que enlaçam a alma.
Que transmitem calma.
Que vertem o choro.
Eu preciso de braços,
mais que o estouro de beijos.
Eu ensejo segurar os pulsos.
Sentir o fluxo que move a mão.
Eu preciso não, de conveniências.
Eu preciso transpor a essência,
e muito mais que sobrepor decências,
Eu preciso do contato que nenhum tato
jamais alcança.
Eu preciso dos risos leves de infância.
Da tranqüilidade imensa e mansa
da presença ao lado.
A serenidade dos olhos fechados.
A inquietude nos olhos abertos.
Eu preciso, decerto, dos braços
para chegar a enxergar os traços
daquilo que diz-se eu te amo.

domingo, 8 de junho de 2008

Se tocar...

Toque! Toque! Toque!
Ela olha o telefone
E torce.
Coração retorcido
de tanta espera.
Ela supera, sempre.
Mas suspira
a ausência.
E respira,
intensa.
Que na dormência
Dos fins de tarde
A alma alarga,
aperta tanto!
E ela aguarda.
E ela torce.
Ela guarda.
Toque. toque. toque.
Toc. toc. toc.
Seu toque.

quinta-feira, 5 de junho de 2008

As
lágrimas
de alegria
não derramam.
Elas beiram os cílios.
Beijam as pálpebras.
Brilham os olhos.
E vão regar
a alma.

quarta-feira, 4 de junho de 2008

(v)espera

Minhas semanas passaram a ter
sete dias.
cento e sessenta e oito horas.
dez mil e oitenta minutos.
além de seis noites de sonho.
e uma madrugada em claro.
toda semana agora
tem véspera de feriado.
de festa de aniversário.
de passeio da escola.
minha semana demora.
mas o dia chega.

domingo, 1 de junho de 2008

Musicalidades

Perdi-me em meus compassos.
Eu não sei mais me compor.

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Minha voz é grave e baixa.
Minha voz disfarça
o tom agudo da minha alma.

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Melo-dias sem Sol
Sempre fazem-me chorar.

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Eu sou o acordo
do alegre e triste
dos acordes em Mi Menor.