Tatoagem

Quis ser madeira.
E conhecer por inteira
A acústica da alma.
Ser viola, batuque, piano.
Quis ser pano.
Posto em posto alto
Nos dias de festa.
Quis hastear-se sem pressa
Em seu hino de fala falha.
Quis ser palha.
E queimar em migalhas
Tanta comodidade chata.
Quis ser lata.
Quis ser prata.
Quis ser ouro.
Quis ser estouro de brilho
E transtornar o fascínio
Com seu grito.
Quis ser granito e mármore.
Quis ser concreto.
Demolir traços retos
Reerguer-se em novo passo.
Quis ser aço.
Que se molda com calor.
Que segura o que for.
Quis ser dura
Como a textura
Na parede do quarto.
Quis reunir seus cacos.
E poder ser fraca.
Quis ser vidro.
Quis ser viva.
Como quem acha
Que vale a pena.
Quis ser borracha.
Quis ser plástica.
Quis ser cimento.
Quis saber assentar
Cada momento
Com que se constrói
O alicerce da vida.